Nos últimos anos, o setor energético brasileiro enfrentou desafios que colocaram em risco não apenas o fornecimento de eletricidade, mas também a estabilidade econômica, social e ambiental do país. A combinação de fatores climáticos, estruturais e de gestão expôs vulnerabilidades históricas e ressaltou a urgência de repensar estratégias para garantir um futuro mais sólido e sustentável.
Desde o racionamento de 2001, momentos de escassez retornaram com força em 2021 e sinais de alerta apontam para desafios renovados até 2025. A 65,2% da eletricidade brasileira é gerada pelas hidrelétricas, segundo dados da EPE de 2021. Essa alta dependência das hidrelétricas torna todo o sistema particularmente sensível às variações no regime de chuvas.
Adicionalmente, eventos climáticos extremos e intensos, como secas prolongadas e o fenômeno El Niño, têm agravado a situação, levando a níveis críticos em reservatórios e forçando a adoção de medidas de contingência para evitar colapsos no abastecimento.
O aumento das tarifas de energia elétrica foi um dos efeitos mais imediatos sentidos por residências, comércios e indústrias. Entre 2021 e 2023, a conta de luz subiu, em média, 20% no Brasil. Esse impacto direto no bolso dos consumidores refletiu-se na inflação de 2023, que fechou em 6,5%, acima da meta estabelecida pelo Banco Central.
Os desdobramentos não se limitaram aos preços ao consumidor final. A escassez de energia e os custos elevados geraram pressão sobre cadeias produtivas, afetando principalmente setores intensivos em consumo energético, como alumínio, aço e cimento. Pequenas e médias empresas reduziram seu ritmo ou encerraram atividades, colocando em risco empregos e comprometendo a competitividade do produto nacional no mercado internacional.
Diante desse cenário, o governo recorreu a soluções emergenciais, como o uso de termelétricas a gás emergenciais e acordos de importação de energia, por exemplo da Venezuela para suprir o estado de Roraima, o que elevou ainda mais os custos do sistema elétrico.
O modelo atual do setor elétrico brasileiro expõe fragilidades que vão além da dependência hidrelétrica. A limitada diversificação da matriz energética e a falta de investimento em infraestrutura de transmissão prejudicam a integração eficiente de fontes alternativas, dificultando o aproveitamento integral do potencial solar e eólico.
Outro ponto crítico é a gestão da demanda: horários de pico intensos, falta de incentivos para o deslocamento do consumo e baixa flexibilidade das redes agravam a pressão sobre o sistema, especialmente em momentos de baixa geração hidrelétrica.
Para enfrentar as crises, é fundamental apostar na diversificação da matriz energética. O Brasil possui grande potencial para fontes renováveis descentralizadas, como solar e eólica, que podem reduzir a pressão sobre as hidrelétricas e ampliar a segurança do sistema.
Além disso, políticas públicas voltadas para melhorar a gestão da demanda e a modernização das hidrelétricas existentes são essenciais. Tarifas dinâmicas podem estimular consumidores residenciais e comerciais a consumirem energia em horários de menor demanda, aliviando picos críticos.
Outros países já enfrentaram situações semelhantes e implementaram soluções que podem servir de referência. A integração de sistemas distribuídos e a adoção de tecnologias avançadas de monitoramento melhoraram a resiliência em regiões vulneráveis, assim como a criação de protocolos de resposta rápida e de microrredes capazes de operar de forma autônoma.
Ferramentas baseadas em inteligência artificial têm permitido previsões mais precisas de demanda, enquanto modelos de financiamento colaborativo tornaram viáveis projetos comunitários de geração descentralizada. O fortalecimento da governança e da capacidade de adaptação diante de variabilidades climáticas é um dos principais legados dessas experiências e deve orientar as ações no Brasil.
As projeções climáticas indicam que eventos extremos podem se tornar mais frequentes até 2025, exigindo respostas rápidas e coordenadas. Ferramentas como a métrica LOLE (Loss of Load Expectation) são fundamentais para balizar o planejamento estratégico e evitar racionamentos ou apagões.
O desafio é grande, mas a combinação de inovações tecnológicas, investimentos robustos em inovação e infraestrutura e políticas públicas alinhadas pode transformar a crise em uma oportunidade histórica de modernização. Só assim o Brasil garantirá um sistema energizado, resiliente e sustentável.
É necessária uma ação integrada entre governo, setor privado e sociedade civil para promover a transição energética de forma equitativa e eficiente. A responsabilidade compartilhada e o compromisso de cada agente serão determinantes para que o país alcance um futuro energético mais seguro e próspero.
Referências